Estabilidade versus Fundo de Garantia

04/12/2024

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Por Almir Pazzianotto Pinto

                        Em congressos promovidos periodicamente por academias de direito do trabalho, ressurgem candentes discussões sobre o tema estabilidade no emprego. O assunto é antigo, mas continua a provocar debates. Remonta à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de 1943, cujo art. 492 determinava: “O empregado que contar mais de dez anos de serviço na mesma empresa não poderá ser demitido senão por motivo de falta grave ou circunstância de força maior, devidamente comprovadas”.

                        Deixarei de transcrever os demais dispositivos relativos à matéria porque, não tendo sido expressamente revogados, são encontrados em edições recentes da CLT.

                        Boa parte de jovens juízes e advogados, em atividade, deve ter se esquecido das origens da Lei nº 5.107, 13/9/1966, instituidora do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Breve história de como aconteceu é encontrada no livro O Governo Castello Branco, de Luís Viana Filho (Livraria José Olympio Editora, RJ, 1975). O objetivo consistia na criação de sistema alternativo à indenização por tempo de serviço e à estabilidade, mediante engenhosa possibilidade de opção pelo moderno regime.

                        Desnecessário dizer que a lei, apesar de duramente combatida pelos sindicatos profissionais, foi aprovada, entrou em vigor e alcançou rápido sucesso entre empregados e empregadores. Atenta à realidade, a Assembleia Nacional Constituinte não titubeou e incluiu FGTS entre os direitos sociais na Constituição de 1988.

                        O inciso I do Art. 7º trata da garantia do trabalhador contra despedida arbitraria ou sem justa causa, “nos termos de lei complementar que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos”. O inciso II assegura o seguro-desemprego, e o III o FGTS.

                        Para remediar a ausência da lei complementar, exigida pelo inciso I, o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (APDT) ordena pagar ao empregado demitido arbitrariamente, ou sem justa causa, indenização correspondente a quatro vezes “a porcentagem prevista no art. 6º, caput, e § 1º, da Lei nº .107, de 13 de dezembro de 1966.”

                        No lugar da legislação referida, hoje temos a Lei nº 8.036, de 11/5/1990, com dispositivos idênticos, como não ignoram o governo, empregados, patrões e a Justiça do Trabalho.

                        Parece-me impossível o retorno ao sistema primitivo da CLT, com pagamento de indenização por tempo de serviço, ao demitido sem justa causa, e garantia de estabilidade ao empregado com mais de dez anos de serviço ao mesmo empregador. São sistemas jurídicos excludentes. Ou um, ou outro.

                        Creio, por outro lado, que o governo não se encontra em condições de renunciar às contribuições devidas obrigatoriamente ao FGTS, pelos patrões. São mais de 217 milhões de contas que proporcionaram à Caixa Econômica Federal, em 2022, arrecadação da ordem de R$ 12,8 bilhões, dinheiro destinado a investimentos de interesse social.

                        Aos trabalhadores convém perder a segurança do FGTS, em nome de hipotética indenização, cujo pagamento se sujeita à existência de recursos financeiros do empregador, ou de estabilidade, após dez anos de ininterruptas atividades na mesma empresa?

                        Creio que não. Estamos no século 21, não mais no remoto ano de 1943. Os tempos são outros. Trabalhadores jovens não pretendem alcançar a velhice na mesma empresa. Outros, em grande quantidade, optam pelo empreendedorismo. Trabalharão em liberdade, por conta própria, como PJ, sem subordinação, horários rígidos, salários fixos e contribuições obrigatórias ao INSS. Muitos, se preocupam em terminar curso superior em alguma faculdade. Assim que se formam, irão ao mercado, como profissionais qualificados.

                        Ao empregador – micro, pequeno, grande – também não me parece vantajoso o retorno ao regime da Consolidação. Recorrerão inevitavelmente à rotatividade, para fugir ao passivo oculto, ao pagamento de altas indenizações e, sobretudo, à estabilidade. Como disse alguém, e a experiência comprova, o capital é sábio, móvel e covarde.

                        Estou certo de que projeto destinado a restabelecer a indenização e a estabilidade, se houver, provocará acesos debates, mas até ser abandonado e arquivado.

                        Retroceder à indenização direta, proporcional ao tempo de serviço, e à estabilidade decendial, é saudosismo. Mera tentativa de devolver o Brasil ao passado.

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião da Academia

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