Paradoxo judicial

14/01/2025

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Por Almir Pazzianotto Pinto

                                    Dizia o economista Milton Friedman: “Não existe almoço grátis”.

                                    A frase irônica é confirmada a cada passo pelos fatos.  Ao fim e ao cabo, toda compra de governo será paga por alguém, conhecido pelo nome vulgar de contribuinte. Vencimentos, quinquênios, gratificações, viagens, diárias, penduricalhos, aposentadorias, pensões, o clipe jogado ao lixo, cafezinhos, açúcar, água mineral, copos de plástico, papel almaço, papel higiênico, celulares, energia elétrica, computadores, impressoras, automóveis, combustíveis, soldos, fardas, coturnos, blindados, e o luxuoso Boeing presidencial, serão debitados dos impostos recolhidos ao Tesouro Nacional.

                                    A interminável relação de itens estará sempre incompleta nesta república tupiniquim, onde o desregramento é princípio não escrito da administração pública, direta e indireta, de quaisquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, indiferentes ao cumprimento do artigo 37 da Constituição.

                                    O Governo Federal é sorvedouro insaciável de dinheiro. O erário se abastece ininterruptamente por pesados tributos. Do berço ao túmulo aqui a vida se resume a pagar impostos. A Casa da Moeda não gera riqueza. Imprime papel como moeda de circulação obrigatória, usado para aquisição de bens e serviços de valor correspondente. O poder aquisitivo do dinheiro flutua de conformidade com o nível sempre oscilante da economia.

                                    Este artigo é escrito a propósito da Justiça Gratuita, e como é praticada no âmbito da Justiça do Trabalho. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), embora generosa com a classe trabalhadora, não adotou a isenção de custas como princípio. Veja-se o art. 789, na redação original: “Nos dissídios do trabalho, individuais ou coletivos, até julgamento, as custas serão calculadas progressivamente, de acordo com a seguinte tabela: (….)”. Facultava-se, porém, aos presidentes dos Tribunais a concessão ex-offício da Justiça Gratuita, “àqueles que perceberem salários igual, ou inferior ao dobro do mínimo legal, ou provarem o estado de miserabilidade”

                                    O dispositivo foi alterado em 2002, quando se determinou que “as custas relativas ao processo de conhecimento incidirão à base de 2% (dois por cento), observado o mínimo de R$ 10,64 (dez reais e sessenta e quatro centavos) e serão calculadas: (….).” . A recente Lei nº 13.467/2017, sobre a Reforma Trabalhista, manteve a autorização do deferimento de justiça gratuita, por juízes, órgãos julgadores, presidentes de tribunais do trabalho, “inclusive quanto a traslados e instrumentos àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social”, bem como “à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo” (art. 790).

                                    Ordena, também, a Reforma Trabalhista, que “Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa” (art. 791-A). 

                                    A Lei nº 13.467/2017 está em vigor. Deve ser respeitada, segundo o clássico princípio da legalidade, prescrito pelo art. 5º, II, da Constituição: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Quando a lei manda pagar, não compete ao juiz absolver, salvo se comprovado estado de miserabilidade.

                                    Em 2024 o Orçamento da União consignou à Justiça do Trabalho R$ 25,4 bilhões, destinados ao pagamento do pessoal, investimentos e custeio. São 3.361 juízes de primeiro grau, 567 desembargadores distribuídos em 24 Tribunais Regionais, 27 Ministros, compondo o Tribunal Superior do Trabalho (TST), e dezenas de milhares de servidores concursados, comissionados ou terceirizados.

                                    O dinheiro pago em custas será significativo. Não me parece, porém, que este é o aspecto mais relevante da questão. Cobrar o pagamento de custas desestimulará ajuizamento de reclamações desnecessárias, solucionáveis mediante acordos extrajudiciais. O excesso de serviço se reflete no histórico problema da morosidade, apontado como um dos principais destaques do Relatório Geral do TST. As reclamações mais comuns se referem a horas extras, multa de 40% do FGTS, adicional insalubridade, multa do art. 477 da CLT.

                                    Os contribuintes nada pedem além da obediência dos magistrados às normas relativas ao pagamento de custas e honorários de sucumbência. Quem decide ajuizar reclamação trabalhista não pode fazê-lo previamente convencido de que a Justiça lhe será gratuita. Antes deve avaliar com cuidado o que planeja fazer, e as possíveis consequências para o bolso.

                                    É injusto impor os ônus de processos malogrados à expressiva maioria pagadora de impostos, que jamais passou pela necessidade pouco agradável de bater às portas da Justiça do Trabalho.

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião da Academia

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